RPS Caso do mês
Aug 2023
Uma síndrome nefrítica pediátrica
Lame Balikani, MD, MPH11
Laura Biederman2, MD2
1. Department of Pathology, Robert J. Tomsich-Pathology & Laboratory Medicine Institute, Cleveland Clinic, Cleveland, Ohio2. Nationwide Children’s Hospital, Columbus, Ohio, USA Ohio State Wexner Medical Center, Columbus, Ohio, USA
Caso clínico
Uma criança do sexo feminino de 7 anos, previamente hígida, evolui com hipertensão arterial, hematúria e proteinúria, com creatinina sérica de 0.41 mg/dL, 4+ proteinúria e >400 hemácias por campo.
Biopsia renal
Figure 1: Glomérulo com hipercelularidade mesangial e endocapilar (H&E 40x).
Figure 2: Remodelamento da membrana basal glomerular (flecha) e crescente celular (ponta de flecha). (Prata de Jones 40x).
Figure 3: Imunofluorescência para C3 positiva em alça capilar glomerular, padrão linear (20x).
Figure 4: Microscopia eletrônica mostra depósitos densos osmofílicos ao longo da alça de capilar glomerular.
Figure 5: Microscopia eletrônica mostra depósitos densos osmofílicos ao longo da membrana basal tubular (flecha).
Diagnóstico final
Doença de depósito denso
Discussão
Doença de depósito denso (DDD) é uma doença rara, relacionada à fração C3 do complemento, com achados ultraestruturais clássicos. Embora historicamente associada à glomerulonefrite membranoproliferativa tipo II, esta entidade nem sempre se apresenta com padrão membranoproliferativo. Existem cinco padrões morfológicos: membranoproliferativo, mesangioproliferativo, crescêntica, agudo proliferativo/exsudativo e inespecífico. O achado morfológico patognomônico é a presença de depósitos densos osmofílicos e transformação da membrana basal glomerular.1 Estes depósitos também podem ser vistos ao longo da cápsula de Bowman e membrana basal tubular. Crescentes focais (como no presente caso) são comumente descritos, e crescentes difusos são incomuns.2 A composição dos depósitos densos é desconhecida, embora a imunofluorescência seja positiva para C3. Estudos de espectrometria de massa demonstram deposição de componentes da via alternativa do complemento.3
DDD classicamente ocorre em crianças antes dos 15 anos de idade, e ambos os gêneros são igualmente afetados.4-6Entretanto, DDD também pode ocorrer em adultos, particularmente quando associado a paraproteinemia. Clinicamente, a apresentação em ambas as faixas etárias é de proteinúria e hematúria, e a etiologia é incerta, mas acredita-se que seja relacionada a hiperativação (genética ou adquirida) da via alternativa do complemento.7 Autoanticorpos anti-complemento e inibição adquirida da fase fluida do complemento tem sido descritos associados a proteínas monoclonais.8-10 Os casos sem paraproteína têm sido associados à presença de fator C3 nefrítico (C3NeF) e/ou predisposição genética, especialmente deficiência de fator H.4,11 Em uma parcela dos pacientes, o gatilho para a DDD pode ser infecção.2,6,12 Embora o C3NeF seja encontrado em aproximadamente 80% dos pacientes com DDD, este achado é não-específico e pode, inclusive, ser encontrado em indivíduos saudáveis.5,13 Uma forma rara de DDD associada a C4 também foi reportado.14
Aproximadamente 50% dos pacientes com DDD progridem para doença renal crônica em estádio final em um intervalo de 10 anos.4,15 Idade jovem, presença de glomerulonefrite crescêntica, proteinúria, elevação da creatinina sérica ao diagnóstico, >20% cronicidade na biopsia inicial, presença de “humps” subepiteliais e, possivelmente, a presença de síndrome nefrótica são preditores de mau prognóstico em pacientes DDD.1,2,4,6,16-18 Infelizmente, DDD recorre frequentemente no transplante renal.4-6,19,20
O tratamento é desafiador e varia dependendo da presença de componente de paraproteína ou alterações genéticas. Imunossupressão incluindo esteroides não é uniformemente efetivo, e não existem trials randomizados para esta entidade.2,5,7,21,22 Existe alguma evidência de sucesso com eculizumab no contexto de transplante renal,19,23-28 embora a utilidade da inibição do complemento siga em investigação e talvez dependa do grau de ativação da via final do complemento.24 Avaliação adicional para alterações genéticas, paraproteínas, e painel de complemento costuma ser realizada nesses casos.
Referências
1. Walker PD, Ferrario F, Joh K, Bonsib SM. Dense deposit disease is not a membranoproliferative glomerulonephritis. Mod Pathol. Jun 2007;20(6):605-16. doi:10.1038/modpathol.3800773
2. Nasr SH, Valeri AM, Appel GB, et al. Dense deposit disease: clinicopathologic study of 32 pediatric and adult patients. Clin J Am Soc Nephrol. Jan 2009;4(1):22-32. doi:10.2215/cjn.03480708
3. Sethi S, Gamez JD, Vrana JA, et al. Glomeruli of Dense Deposit Disease contain components of the alternative and terminal complement pathway. Kidney Int. May 2009;75(9):952-60. doi:10.1038/ki.2008.657
4. Servais A, Noël LH, Roumenina LT, et al. Acquired and genetic complement abnormalities play a critical role in dense deposit disease and other C3 glomerulopathies. Kidney Int. Aug 2012;82(4):454-64. doi:10.1038/ki.2012.63
5. Lu DF, Moon M, Lanning LD, McCarthy AM, Smith RJ. Clinical features and outcomes of 98 children and adults with dense deposit disease. Pediatr Nephrol. May 2012;27(5):773-81. doi:10.1007/s00467-011-2059-7
6. Medjeral-Thomas NR, O'Shaughnessy MM, O'Regan JA, et al. C3 glomerulopathy: clinicopathologic features and predictors of outcome. Clin J Am Soc Nephrol. Jan 2014;9(1):46-53. doi:10.2215/cjn.04700513
7. Pickering MC, D'Agati VD, Nester CM, et al. C3 glomerulopathy: consensus report. Kidney Int. Dec 2013;84(6):1079-89. doi:10.1038/ki.2013.377
8. Sethi S, Sukov WR, Zhang Y, et al. Dense deposit disease associated with monoclonal gammopathy of undetermined significance. Am J Kidney Dis. Nov 2010;56(5):977-82. doi:10.1053/j.ajkd.2010.06.021
9. Meri S, Koistinen V, Miettinen A, Törnroth T, Seppälä IJ. Activation of the alternative pathway of complement by monoclonal lambda light chains in membranoproliferative glomerulonephritis. J Exp Med. Apr 1 1992;175(4):939-50. doi:10.1084/jem.175.4.939
10. Jokiranta TS, Solomon A, Pangburn MK, Zipfel PF, Meri S. Nephritogenic lambda light chain dimer: a unique human miniautoantibody against complement factor H. J Immunol. Oct 15 1999;163(8):4590-6.
11. Xiao X, Pickering MC, Smith RJ. C3 glomerulopathy: the genetic and clinical findings in dense deposit disease and C3 glomerulonephritis. Semin Thromb Hemost. Jun 2014;40(4):465-71. doi:10.1055/s-0034-1376334
12. Suga K, Kondo S, Matsuura S, et al. A case of dense deposit disease associated with a group A streptococcal infection without the involvement of C3NeF or complement factor H deficiency. Pediatr Nephrol. Aug 2010;25(8):1547-50. doi:10.1007/s00467-010-1479-0
13. Servais A, Noël LH, Frémeaux-Bacchi V, Lesavre P. C3 glomerulopathy. Contrib Nephrol. 2013;181:185-93. doi:10.1159/000348654
14. Sethi S, Quint PS, O'Seaghdha CM, et al. C4 Glomerulopathy: A Disease Entity Associated With C4d Deposition. Am J Kidney Dis. Jun 2016;67(6):949-53. doi:10.1053/j.ajkd.2016.01.012
15. Smith RJ, Harris CL, Pickering MC. Dense deposit disease. Mol Immunol. Aug 2011;48(14):1604-10. doi:10.1016/j.molimm.2011.04.005
16. Cameron JS, Turner DR, Heaton J, et al. Idiopathic mesangiocapillary glomerulonephritis. Comparison of types I and II in children and adults and long-term prognosis. Am J Med. Feb 1983;74(2):175-92. doi:10.1016/0002-9343(83)90606-x
17. Liu JC, Yang JY, Xiao HJ, et al. [Clinical and pathological characteristics of children with dense deposit disease]. Zhonghua Er Ke Za Zhi. Aug 2009;47(8):593-7.
18. Cansick JC, Lennon R, Cummins CL, et al. Prognosis, treatment, and outcome of childhood mesangiocapillary (membranoproliferative) glomerulonephritis. Nephrol Dial Transplant. Nov 2004;19(11):2769-77. doi:10.1093/ndt/gfh484
19. Regunathan-Shenk R, Avasare RS, Ahn W, et al. Kidney Transplantation in C3 Glomerulopathy: A Case Series. Am J Kidney Dis. Mar 2019;73(3):316-323. doi:10.1053/j.ajkd.2018.09.002
20. Andresdottir MB, Assmann KJ, Hoitsma AJ, Koene RA, Wetzels JF. Renal transplantation in patients with dense deposit disease: morphological characteristics of recurrent disease and clinical outcome. Nephrol Dial Transplant. Jul 1999;14(7):1723-31. doi:10.1093/ndt/14.7.1723
21. Nester CM, Smith RJ. Treatment options for C3 glomerulopathy. Curr Opin Nephrol Hypertens. Mar 2013;22(2):231-7. doi:10.1097/MNH.0b013e32835da24c
22. Alchi B, Jayne D. Membranoproliferative glomerulonephritis. Pediatr Nephrol. Aug 2010;25(8):1409-18. doi:10.1007/s00467-009-1322-7
23. Bomback AS, Smith RJ, Barile GR, et al. Eculizumab for dense deposit disease and C3 glomerulonephritis. Clin J Am Soc Nephrol. May 2012;7(5):748-56. doi:10.2215/cjn.12901211
24. Kasahara K, Gotoh Y, Majima H, Takeda A, Mizuno M. Eculizumab for pediatric dense deposit disease: A case report and literature review. Clin Nephrol Case Stud. 2020;8:96-102. doi:10.5414/cncs110309
25. Rousset-Rouvière C, Cailliez M, Garaix F, Bruno D, Laurent D, Tsimaratos M. Rituximab fails where eculizumab restores renal function in C3nef-related DDD. Pediatr Nephrol. Jun 2014;29(6):1107-11. doi:10.1007/s00467-013-2711-5
26. Holle J, Berenberg-Goßler L, Wu K, et al. Outcome of membranoproliferative glomerulonephritis and C3-glomerulopathy in children and adolescents. Pediatr Nephrol. Dec 2018;33(12):2289-2298. doi:10.1007/s00467-018-4034-z
27. Oosterveld MJ, Garrelfs MR, Hoppe B, et al. Eculizumab in Pediatric Dense Deposit Disease. Clin J Am Soc Nephrol. Oct 7, 2015;10(10):1773-82. doi:10.2215/cjn.01360215
28. Ozkaya O, Nalcacioglu H, Tekcan D, et al. Eculizumab therapy in a patient with dense-deposit disease associated with partial lipodystrophy. Pediatr Nephrol. Jul 2014;29(7):1283-7. doi:10.1007/s00467-013-2748-5